Descartes deu o mote. A filosofia deste deste espaço é antes de mais dedicado ao sonho, às duvidas existênciais à escrita e ao prazer da leitura, um blog onde a actualidade não pode deixar de estar presente.




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A estrada dos sonhos...

A estrada, que anos antes construíram, para ligar cidades, era apenas uma miragem para os residentes locais nas remotas aldeias perdidas no meio de montanhas, que viviam do que a terra lhes dava ou do que dela conseguiam tirar. Viam ao longe a vida passar a grande velocidade meros espectadores como que figurantes num filme sem nunca o terem visto, ali estava ela ziguezagues suaves, a escassos quilómetros do seu mundo, vista de cima das montanhas, essa movimentada estrada mais lhes parecia uma serpente rastejando por entre as urzes, ou então um caminho por onde as formigas passavam paulatinamente umas atrás das outras. O progresso não tinha passado por ali, pois o que dali vinha, eram apenas sonhos e mais sonhos, observando até há poucos dias os carros passarem a alta velocidade, sem que a eles lhes desse ou deixasse qualquer benefício, apenas fazendo com que os mais novos sonhassem em partir e abandonar a vida de miséria. Viam na grande estrada o futuro, o seu próprio caminho o seu destino que um dia haveriam de tomar quando chegar o seu momento e partir. Para o pequeno guardador de cabras e ovelhas, não era excepção. Sucedeu com os seus conhecidos que já houveram trilhado esse mesmo caminho. Sabia de antemão que o seu dia também haveria de chegar como chegou para o seu irmão mais velho quando o viu partir com destino incerto. Outros partiam apenas para puderem continuar os estudos, pois ali só se podia fazer o ensino básico, até os pequenos se viam forçados a partir, quando acabavam o quarto ano, tinham que partir para casa de familiares ou amigos para a vila mais próxima para puderem fazer o antigo ciclo preparatório, havia quem se aventurasse a fazer três horas a pé, era por isso uma terra madrasta que obrigava os filhos ainda crianças a partir.

O pequeno guardador de cabras de profissão, acabara de substituir o irmão, que de uma hora para a outra zarpou, que por sua vez tinha já sucedido nessas funções ao pai e por aí fora, neste trabalho do pastoreio vindo a passar de irmãos para irmãos ou geração em geração, habituados aos constantes nevões, ficavam por vezes isolados durante semanas ou mesmo meses sem descerem ao povoado, pelo que resistir aos elementos era natural. O pequeno pastor encontrava-se no seu posto de trabalho acompanhado pelo seu cão, um pastor puro, bem maior do que ele, encontrava-se quase no topo da serra a guardar o seu rebanho. Aprendeu com os mais velhos a ler os sinais dos céus, sentiu que vinha mau tempo. Sorte ou talvez não, sentiu pelo ar frio e pela neblina repentina que surgiu tapando o sol, os conselhos bem presentes do pai, lhe disseram que vinha aí um nevão. Não havia tempo a perder, com a ajuda do seu fiel amigo o seu cão da serra recolheu os animais para dentro de uma gruta milhares de vezes utilizadas nessas circunstâncias, com os animais seguros veio até ao exterior avaliar a situação. Não tinha quaisquer dúvidas, vinha mau tempo e não iria demorar muito.

Regressou ao interior da gruta e encolhido no seu canto, aquecido pela fogueira, preparou-se para ali ficar dois ou três dias no mínimo, até deixar de nevar, tal como previu, nem uma hora passada, veio cá fora espreitar e os primeiros flocos começavam a cair. Não havia nada a fazer, assim permaneceu dois dias, de vez em quando vinha espreitar, o melhor que tinha a fazer era ficar junto da fogueira e esperar que o mau tempo passasse. Horas mais tarde o valente cão começou a ficar inquieto, emitindo um latido irritante, andando de um lado para o outro. André pensou tratar-se de algum lobo que tivesse passado perto. Tentando acalma-lo disse-lhe com voz firme mas cheia de ternura: - “anda cá senta-te aqui, anda…” O animal assim fez, veio até junto do dono, de cabeça baixa com o rabo a abanar, como que pedindo protecção. O pequeno pastor passou a mão pela cabeça para que este sossegasse, passado um ou dois minutos, cada vez mais inquieto começou a uivar, André não compreendendo os motivos, pensou que o pobre animal tinha enlouquecido, impaciente pegou num pequeno pau que tinha perto de si, para manter a fogueira acesa, e em tom ameaçador ordenou que se sentasse novamente e ficasse quieto e calado. Interrogava-se como era possível, um animal que sempre fora destemido naquela terra de lobos, como poderia estar a dar sinais claros de medo. Segundos depois André percebeu o motivo de toda aquela agitação, que tinha visto no pobre animal, pois subitamente sentiu a terra tremer, uma vez, outra e mais outra, sendo a ultima a mais forte de todas, prostrados no chão, ali ficaram aninhados, os animais aterrorizados berravam numa gritaria infernal caindo uns sobre os outros. Apavorado encolheu-se contra o seu cão que entretanto tinha rastejado até junto dele e o lambia cheio de ternura, juntos ficaram abraçados, assim permanecendo imóveis durante largos minutos. Por fim os animais começaram a levantar-se ficando um pouco mais calmos, acabando por se calarem.

A gruta revelou-se um excelente refúgio natural...

5 comentários:

  1. Antonio,

    é sabido que os animais tem maior percepção, principalmente com as tempéries da natureza. Muito bom o texto!


    PS "...Outros partiam apenas para puderem continuar os estudos, pois ali só se podia fazer o ensino básico, até os pequenos se viam forçados a partir, quando acabavam o quarto ano, tinham que partir para casa de familiares ou amigos para a vila mais próxima para puderem fazer o antigo ciclo preparatório, havia quem se aventurasse a fazer três horas a pé, era por isso uma terra madrasta que obrigava os filhos ainda crianças a partir..."


    Esta terra madrasta aqui existe tal como o teu conto. Principalmente no nordeste brasileiro. E foi assim que meu marido pode estudar. Ainda hoje a sua cidade é de anciões que não abandonam seus lares. Quis o destino que fosse meu marido o unico dos irmãos a estudar, depois vindo para o RJ trabalhar para se formar. Por tudo isso hoje é um profissional brilhante . E não perdeu suas raizes e humildade.


    Beijos e ótima semana

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  2. Gostei destas tuas descrições! Uma fantasia que bem pode ser a tradução pura da realidade.
    Nascemos todos iguais, mas o sítio onde isso acontece é que nem sempre mantém esse direito até à morte. Aí, uns são filhos de um Deus menor, enquanto outros encontram o bem-estar, sem grande esforço...
    Mas a vida simples não poderia ser par todos nós arazão da felicidade, desde que igual????Então não haveria terras madrastas!!!
    Gosto deste Blogg!
    abraço
    Meg

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  3. Nem tem o que falar...ou melhor TEM SIM!!!

    MUITO BOMMMMMMMMMMM!!! Adorei!!!

    Um texto que a gente TEM que terminar!

    Espero uma visitinha tua!

    Beijos

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  4. Oi António! Fiquei muito feliz com a tua visita e com o comentário que deixaste no nosso humilde espaço. Espero que voltes mais vezes, pois será sempre um prazer renovado.

    É, esse é um tipo de coisa que infelizmente acontece não só aí em Portugal, mas em toda parte do mundo, inclusive aquí no Brasil. Atualmente os donos do poder, pouco estão se importando com o que possa ou não acontecer, não só com os turistas, mas até mesmo com os nativos. Pra eles, o que importa é o dinheiro deixado pelo turista, e assim, engordarem suas contas bancárias.

    Se o monumento ou imagem é de importância cultural/ambiental e deve ser preservado(a), que seja, porém, que se instale algum tipo de proteção a fim de assegurar e salvaguardar a vida dos visitantes.

    Resta-me somente lamentar pelas vidas ceifadas e pedir a DEUS que os receba de braços abertos, os abençoe e os ilumine em suas trajetórias.

    Perdoe-me pelas baboseiras.

    Abraços,

    Furtado.

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